ESPECIAL ABCP: As ações de Rondônia no enfrentamento à pandemia

Este é o décimo quarto texto da 3ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 13 e 17 de julho na página da ABCP. Acompanhe!

Este é o décimo quarto texto da 3ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 13 e 17 de julho na página da ABCP. Acompanhe!

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COVID-19 em Rondônia: interiorização, flexibilização e desigualdade

Nome dos(as) autores(as): Luis Fernando Novoa Garzon e Patrícia Mara Cabral de Vasconcellos

Instituição à qual os(as) autores(as) estão vinculados(as): Professor da Universidade Federal de Rondônia (DCS/UNIR); Professora da Universidade Federal de Rondônia (DCS/DHJUS/UNIR)

Titulação dos(as) autores(as) e instituição em que a obtiveram: Doutor em Planejamento Urbano e Regional pela UFRJ; Doutora em Relações Internacionais pela UnB.

Região: Norte

Governador (Partido): Marcos Rocha (PSL)

População: 1.777.225 (est. IBGE, 01/07/2019)

Número de municípios: 52

Casos confirmados em 13/07/202027.050

Óbitos confirmados em 13/07/2020647

Casos por 100 mil hab.: 1.522

Óbitos por 100 mil hab.: 36,4


* Por: Patrícia Mara Cabral de Vasconcellos e Luís Fernando Novoa Garzon

Em 18 de junho de 2020, completaram-se 90 dias desde o primeiro caso de Covid-19 em Rondônia. Desde então, três fatos ilustram a complexidade social do enfrentamento à pandemia e os impasses político-econômicos.

Primeiro: o avanço do processo de interiorização dos casos de COVID-19, atingindo todos os municípios do estado. Segundo: as mudanças nos critérios que embasam a classificação dos municípios em cada uma das fases de distanciamento social. Terceiro: a distribuição geográfica dos casos dentro da capital do estado. 

No dia 12 de julho, o total de casos confirmados em Rondônia era de 26.728, dos quais 56,8% estavam localizados em Porto Velho [1]. Depois da capital, os seis municípios com maior número de casos confirmados eram Guajará-Mirim, Ariquemes, Jaru, Candeias do Jamari, São Miguel do Guaporé e Ji-Paraná, representando juntos 24,2% do total de casos. 

Relembra-se que, em 14 de maio, o decreto n. 25.049 [2] do governo estadual estabeleceu quais seriam os critérios que determinariam o distanciamento social. Haveria 4 fases e o estado estaria dividido em duas macrorregiões hospitalares.

Para a classificação nas fases, havia dois critérios. Um era a taxa de incidência de COVID-19 por 100 mil habitantes e o outro era a proporção de leitos de UTI adultos ocupados por casos de COVID-19 por macrorregião de saúde. Enquadrar-se-iam na fase 1, por exemplo, a macrorregião cuja proporção de leitos ocupados fosse acima de 50% e cuja taxa de casos novos nos últimos sete dias fosse maior ou igual a 20.

Contudo, partindo da hipótese de que atingir tais condições tornou-se imprevisível, em 15 de junho, um novo decreto [3] alterou os critérios. Para a fase 1, a proporção de leitos ocupados deveria estar acima de 80% e menor que 90% e a taxa de incidência em valor maior ou igual a 30.

A alteração da diretriz certamente permitiu que municípios flexibilizassem suas atividades, contudo, a legislação ainda tinha como referência a macrorregião. Assim, em 6 de julho, em mais um decreto [4], passou-se a considerar a taxa de ocupação de leitos do município – ao invés da macrorregião.

Adicionalmente, em 10 de julho, outro decreto [5] estipulou que, em substituição à taxa de casos novos, devia-se considerar a taxa de crescimento de casos ativos da COVID-19, contabilizando, assim, somente os casos que pudessem indicar utilização de leitos de UTI. 

Dessa forma, paralelamente ao processo de interiorização dos casos, ocorre a adequação da legislação para flexibilizar o isolamento social. Ariquemes e Jaru, por exemplo, foram classificados na fase 2 a partir de 8 de julho. No decreto de 10 de julho, houve novo enquadramento e, a partir de 14 de julho, Porto Velho e mais 36 munícipios passaram para a fase 3, ou seja, para a ampliação do funcionamento das atividades econômicas. 

Em contexto de combinação de crise sanitária, econômica e político-institucional, a escala nacional sequer foi agenciada como escopo de atuação coordenada entre União, Estados e Municípios no combate à pandemia.

Diante da supressão do papel coordenador do Ministério da Saúde e da atuação desatinada da Presidência da República em nome do retorno incondicional à “normalidade”, cada unidade federativa ficou à mercê da pressão do poder econômico. 

Movimentações e lobbies empresariais como o Grupo “Pensar Rondônia” [6] promovem carreatas e pressionam os agentes políticos. Em manifesto recente, o grupo lançou a invectiva do “até quando” se manteria a quebradeira de empresas e as demissões em massa, “impedindo as pessoas de ganhar o pão de cada dia, o seu sustento?”.

Vê-se que há uma relação direta entre o negacionismo da pandemia e de seus efeitos e práticas empresariais nada afeitas à regulação social e a contrapartidas para a sociedade em termos de segurança à vida e proteção ao meio ambiente.

Com relação à capital do estado, a dispersão dos casos em bairros considerados de baixa renda ilustra a desigualdade social, tanto nas condições para manter o isolamento social, quanto nas condições sanitárias e de acesso à saúde.

Acopla-se o primeiro estágio de disseminação, iniciado em bairros melhor munidos de serviços urbanos, com o segundo estágio de dispersão em direção às zonas periféricas da cidade (Zona Sul e Zona Leste), que passam a concentrar o maior número de ocorrências e de óbitos [7].

As variações acompanham a densidade demográfica dos bairros dessas zonas, o que é um marcador (considerada a subnotificação dos casos) da extensividade do contágio nesses territórios periurbanos. 

Quanto às atividades econômicas em que se verificou maior incidência do vírus, a exemplo do ramo frigorífico, mudanças drásticas nas condições de trabalho, que já eram requisitadas antes da pandemia, deverão agora se tornar inadiáveis para que seja admissível a retomada de suas atividades.

É preciso considerar que as dinâmicas de propagação da COVID-19 estão vinculadas tanto a fluxos comerciais como de trabalho no tocante às redes de contatos cotidianos entre as pessoas. 

O aprofundamento e o refinamento da análise das diferenciações espaciais e sociais da letalidade da COVID-19 em cada país, estado e município poderá proporcionar a visualização de variáveis determinantes e, consequentemente, uma expansão calibrada de políticas públicas e de normas trabalhistas.

É incerto qual será o aprendizado social oriundo dessa pandemia, mas é certo que somente haverá saída se soubermos conjugar esforços nas distintas esferas para que sociedade, Estado e mercado possam ser reinventados à luz dessa dramática experiência. 

Referências bibliográficas:

[1] A dispersão para o interior do estado acentuou-se nos últimos meses. Em termos comparativos, em 12 de maio Porto Velho centralizava 75,9% dos casos, 30 dias depois, em 12 de junho, eram 63,2% casos.

[2] RONDÔNIA. DECRETO N° 25.049, DE 14 DE MAIO DE 2020. Disponível em: <http://www.rondonia.ro.gov.br/publicacao/decreto-n-25-049-de-14-de-maio-de-2020/>. Acesso em 15 mai. 2020.

[3] RONDÔNIA. DECRETO N° 25.138, DE 15 DE JUNHO DE 2020. Disponível em: <http://www.rondonia.ro.gov.br/publicacao/decreto-n-25-138-de-15-de-junho-de-2020-reabertura-comercial/>. Acesso em 8 jul. 2020.

[4] RONDÔNIA. DECRETO N° 25.195, DE 6 DE JULHO DE 2020. Disponível em:  <http://www.rondonia.ro.gov.br/publicacao/decreto-no-25-195-de-6-de-julho-de-2020/>. Acesso em 8 jul. 2020.

[5] RONDÔNIA. DECRETO N° 25.220, DE 10 DE JULHO DE 2020. Disponível em: <http://www.rondonia.ro.gov.br/publicacao/decreto-n-25-220-de-10-de-julho-de-2020/>. Acesso em 12 jul. 2020

[6] GRUPO PENSAR RONDÔNIA. Comunicado do Grupo Pensar Rondônia. Disponível em: https://fecomercio-ro.websiteseguro.com/site/index.php/2016-09-02-06-09-26/noticias-fecomercio/item/1264-comunicado-do-grupo-pensar-rondonia. Acesso em 12 jun. 2020

[7] Em 12 de julho, os dez bairros com mais casos confirmados em Porto Velho eram: Socialista (409); Aponia (395); Agenor de Carvalho (394); Nova Floresta (370); Nova Porto Velho (365); Caladinho (349); Embratel (339); Castanheira (333); Nacional (332) e Tancredo Neves (306). Fonte: SESAU/RO.

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